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Fronteira da Índia com o Nepal: nada é tão ruim que não possa piorar, mas no final tudo dá certo!

Saímos de Varanasi, na Índia, para cruzarmos a fronteira com o Nepal e irmos em direção a Pokhara, nos pés do Himalaia. Para quem conhece, ou observa pela primeira vez o mapa desse percurso, verá que a direção a ser seguida desde Varanasi até a fronteira, é norte, e então, até Pokhara, é noroeste. Mas peraí! Qual seria o motivo do título dessa postagem se essa seria - e era o que esperávamos - uma viagenzinha demorada, mas bem tranquila?

Tudo começa em Dharamsala, na Índia, cidade onde o décimo quarto Lama, o Dalai, escolheu para montar o governo tibetano no exílio, desde 1959, quando foi expulso da China.

McLeod Ganj - parte alta de Dharamsala

Pois é, quando chegamos nessa cidade, socada no Himalaia indiano, vindos de Amritsar no Punjab, contraí uma infecção intestinal daquelas de se dobrar..."nunca estamos a salvo" quando se fala em Índia, por mais que os sucos que tomássemos viessem sem gelo, por mais água mineral "lacrada" que tomássemos e por menos pimenta que ingeríssemos, sempre teria uma aguinha "não potável" sorrateira na hora de escovar os dentes ou na hora do banho que acabava por adentrar em nossos corpos e causar um baita estrago.

Diante dessa situação, lancei mão da nossa farmacinha. Saquei uma cartela de Imosec e li a bula: tomar 3 comprimidos por dia e ainda 1 a cada evacuação. Meu Deus!! Talvez tenha lido errado, sei lá, o fato é que nesse dia tomei nada mais, nada menos que 7 comprimidos!! Momentaneamente foi um alívio porque me trancou praticamente de imediato.

A Claudia já tinha experimentado a sensação da diarreia indiana em Jaipur, no Rajastão, mas foi bem mais leve que a minha.

Seguimos em nossas andanças pelo subcontinente indiano até chegarmos na fronteira com o Nepal, em Sunauli, depois de 6 dias de eu ter tomado aquela montanha de Imosec. Nesse dia, eu já estava "sonhando em ir aos pés"...ai que saudade da diarreia, parecia que tinha um bloco de concreto dentro da barriga que só sairia se fizesse um corte de 30cm no estômago!

Não bastasse essa situação de desespero, aí é que vem a derradeira situação de caos TOTAL:

A viagem até Pokhara seria de 8 horas em direção noroeste no Nepal. Pegamos um onibuzinho - no início da tarde - lotado de nepaleses que não falavam sequer uma palavra de inglês e, depois de 10 horas de viagem, com três mochilas completamente cheias que eram transportadas no teto (pelo lado de fora) do ônibus, e desconfiados de que alguma coisa estava errada, peguei minha bússola e a pior das constatações aconteceu: estávamos indo para leste durante mais ou menos 1 hora!!!

Perguntávamos por Pokhara para todos e absolutamente ninguém respondia coisa com coisa. Os nervos da Claudia estouraram quando vimos do nosso lado esquerdo um penhasco, e do lado direito uma montanha gigantesca. O desespero pairou por alguns momentos! Estávamos no meio do nada, indo para não sabíamos aonde...

Depois de tantos checkpoints do exército nepalês e numa parada rápida num povoado, decidimos desembarcar e ficar por ali mesmo. Saltamos do ônibus e, num ato de extrema rapidez, subi no teto e desamarrei os mochilões antes que o ônibus partisse, tal era a pressa com que o motorista queria sair dali.

Naquele momento, apareceu um japonês, falando meias palavras em inglês, que nos deu a entender que estávamos fazendo aquele percurso (ou seja, indo em direção contrária ao nosso destino) em função da GUERRILHA MAOÍSTA!! Pegamos um táxi que nos levou até a cidade de Mugling, achamos um hotelzinho fuleiro e nos instalamos. O desespero se abrandou. Pelo menos para a Claudia, porque eu estava a ponto de nem conseguir me dobrar mais, afinal era o sétimo dia sem saber o que era um vaso sanitário!

Quando abrimos a janela do quarto, vimos nosso ônibus estacionado do outro lado da rua, com TODAS as pessoas que viajavam dormindo...realmente foi muito difícil entender o que acontecia.

Mugling - no meio do nada no Nepal

Um cara do hotel mais tarde conseguiu nos explicar: de noite é muito perigoso viajar pelo Nepal, por causa dos guerrilheiros maoístas, então, quando não se tem tempo de chegar no destino ainda de dia, eles pernoitam no ônibus, em algum lugar que seja seguro, e no dia seguinte seguem viagem. 

checkpoint do exército nepalês próximo a Mugling

Ainda tentamos nos informar sobre possíveis meios de transporte até a capital Kathmandu, afinal o dia tinha acabado, e se fôssemos até Pokhara e retornássemos à capital não teríamos tempo de fechar o roteiro que tínhamos planejado. 

A Claudia dormiu, eu só tentei, parecia que tinha uma banda de heavy metal dentro da minha barriga. Por volta das 6 horas da manhã, bateram na porta do nosso quartinho, atendi e era um carinha dizendo: "Kathmandu, Kathmandu, five minutes, five minutes!!!" Correria total, juntar mochilas, e sem saber preço, sem saber nada, em 5 minutos estávamos dentro de uma van que nos levou até Kathmandu numa boa, com conforto, sem ter que lutar por espaço com ninguém. Deu até pra apreciar a paisagem do interior do Nepal. Os locais devem ter comentado que havia um casal de viajantes que estava ali à procura de transporte para Kathmandu.

Chegando em Kathmandu, ficamos sabendo que os maoístas tinham assassinado (!!!) 11 pessoas naquela noite em um ônibus que vinha de Jiri, nordeste do país, para a capital.

A preocupação passou, mas e a minha prisão de ventre?

Chegamos finalmente numa farmácia, e eu nem conseguia mais falar, só gemia. A Claudia então mandou ver, em inglês, com o farmacêutico nepalês: "Seguinte, ele estava doente, indo demais ao banheiro, e tomou remédio para trancar, agora precisa de um remédio para soltar tudo o que está trancado". O cara entendeu, se virou no balcão, e da prateleira tirou um pote onde haviam várias drágeas, daquelas transparentes, e dentro delas uma coisinha verde, que pareciam folhinhas... resultado: compramos 2 e, com aquilo em mãos, seguimos para o hotel num cycle rickshaw, sacolejando feito bolacha em boca de véia. Minha rota foi direto ao banheiro, mais especificamente o tão sonhado vaso sanitário, onde fiquei por felizes e inesquecíveis 15 minutos. Detalhe: com os 2 comprimidos na mão!! Não tenho dúvidas de que foi tudo psicológico: por mais desesperado que eu estivesse, acho que jamais iria conseguir ingerir aqueles comprimidos.

Moral da história: não se toma 7 comprimidos de Imosec num mesmo dia e não se viaja para o Nepal antes de se informar sobre a situação política do país.



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Marlon Sandri Pegoraro

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4 comentários:

  1. Isso tudo sem contar que naquela noite em Mugling eu fui dormir morta de fome, porque no maldito lugar não havia um mísero lugar pra comer alguma coisa, enquanto o Peg nem se preocupava com isso, porque estava "de barriga cheia" heheheh...

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  2. Estou pensando em ir ao Nepal e India... Gostaria de saber se é possivel se ver o mt Everest numa dessas trips?

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  3. É possível sim, Marcelo. Desculpe responder só agora, não tinha visto teu comentário antes! A estas alturas, já deves até ter visto o Monte Everest, mas de repente a resposta serve para outros leitores - nós vimos o Everest do avião diversas vezes em trajetos sobrevoando o Nepal, vindo da China, indo para a Índia ou Tailândia - só tem que ter o cuidado de sentar do lado certo do avião e rezar que o tempo esteja bom, com céu limpo...daí é só esperar pelo alvoroço dentro do avião - quando o povo ficar todo excitado, é porque chegastes lá! Se não, podes pegar uns vôos que saem de Kathmandu especialmente com esta finalidade, se não me engano se chamam "Everest express" - eles fazem um "bate e volta" ao Everest, desde a cpital nepalesa.

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